27 de set. de 2017

Independentemente do seu valor artístico, Faces se faz, queira ou não, um grito de alerta diante da grave instabilidade política pela qual passa o Brasil, que dá sinais de retrocesso na aplicação de projetos e ações reparatórias que privilegiavam indígenas e descendentes de escravos


Exposição 'Faces', do fotógrafo Alvaro Villela,  revela almas de quilombolas da Bahia

abertura 31 de agosto no Espaço Furnas Cultural



Depois de ser apresentada no Museu de Arte da Bahia, em 2015, e com 15 expressivos e reveladores retratos de habitantes de comunidades quilombolas de Barra e Bananal, na Chapada Diamantina, além de uma carta de alforria que data do século 19, será aberta na quinta-feira, 31 de agosto, no Espaço Furnas Cultural, em Botafogo, a exposição Faces, do fotógrafo baiano Alvaro Villela.

Apresentada também no PhotoEspaña, em 2011, como parte de uma coletiva itinerante de fotógrafos latino-americanos,  Faces  é uma imersão sinestésica na vida e no habitat de um grupo de descendentes de escravos fugitivos de um navio negreiro naufragado na costa sul da Bahia, no século 17. Isso porque, além das  expressões dos retratados, sons ambientes captados nas noites dos quilombolas vão compor a exposição, estética que, juntamente com a disposição da luz, confere-lhe, também, um sentido de instalação.



Independentemente do seu valor artístico, Faces se faz, queira ou não, um grito de alerta diante da grave instabilidade política pela qual passa o Brasil, que dá sinais de retrocesso na aplicação de projetos e ações reparatórias que privilegiavam indígenas e descendentes de escravos, por exemplo. Sintomaticamente, há poucas semanas, na Chapada Diamantina, foram assassinados seis moradores de comunidades quilombolas, crime que entrou apenas nas estatísticas.

Assim, em tempos nos quais importantes temáticas envolvendo a questão do povo negro no Brasil ganharam os holofotes, como foi o caso da celebração ao escritor carioca Lima Barreto, homenageado recentemente na Flip, em Faces, questões artísticas à parte, vai estar exposto um lado da tragédia, com toda a complexidade que a cerca.

Fotógrafo etnográfico, como comprova o seu projeto desenvolvido junto aos índios pankararé, do Raso da Catarina, no sertão da Bahia, entre outros, ainda que não goste de se sentir aprisionado por rótulos, Alvaro Villela aproximou-se das comunidades quilombolas da Chapada Diamantina em 2007 no intuito de entender e documentar suas tradições culturais e religiosas e verificar se elas ainda preservavam traços ancestrais.

No entanto, diante da percepção de que tais heranças foram diluídas no interior de certos maneirismos, inclusive com a presença de religiões que não eram de matriz africana, Villela vislumbrou no retrato uma forma de discutir tal distanciamento da cultura ancestral.

Após anos de interação com as comunidades, ele improvisou um estúdio na casa de uma moradora entusiasta do projeto. Apesar da resistência inicial e utilizando-se de um fundo negro e da iluminação gerada por uma tocha, fotografou residentes de todas as idades, os quais acabaram se rendendo ao se verem retratados.

Passados 10 anos desde a primeira incursão de Alvaro Villela nos territórios quilombolas, a exposição, não apenas pela força das suas imagens, como também pelas dificuldades e desafios enfrentados por tais comunidades, apresenta-se como um ato de resistência e de afirmação de certos valores do povo negro, que ainda hoje busca um espaço digno no Brasil.

Apesar de consciente do viés antropológico e sociológico da exposição, Alvaro Villela também destaca em Faces o seu sentido enquanto expressão artística contemporânea, sinestésica, de uma composição que ganha força a partir da percepção de quem elaborou e construiu as imagens juntamente com o desprendimento de quem pousou, de quem invocou através da expressão uma ancestralidade perdida.


Além das 15 fotos em grande formato (80 x 120 cm) e dos sons das noites dos quilombolas, na exposição o público vai se deparar com uma carta de alforria datada do século 19 e devidamente transcrita, que faz parte do acervo dos artistas plásticos Joãozito Pereira e Lanussi Pasquali. A peça, uma verdadeira relíquia, é originária do Recôncavo Baiano, onde havia forte presença de escravos nos séculos passados.
A exposição Faces, vencedora do edital Eletrobras Furnas, Ministério das Minas e Energia e Governo Federal,


A exposição Faces, vencedora do edital Eletrobras Furnas, Ministério das Minas e Energia e Governo Federal, vai ocupar o Espaço Furnas Cultural no mês de setembro. No mesmo período, alunos de escolas públicas do Rio de Janeiro vão participar de visitas guiadas com o artista.


Saiba mais 

Faces – Exposição fotográfica de Alvaro Villela

Quando: Abertura 31 de agosto de 2017, às 19h

Onde – Espaço Furnas Cultural – Rua Real Grandeza, 219, Botafogo – Rio de Janeiro

Visitação: Terça à sexta, das 14h às 18h, e sábado, domingo e feriado, das 14h às 19h. Não há necessidade de ingresso para exposições

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